domingo, 14 de setembro de 2014

[Resenha] Eu sou Malala, de Malala Yousafzai com Christina Lamb

É impossível querer conhecer e entender a história de quem e a “garota que defendeu o direito à educação e foi baleada pelo talibã” sem passar por outros momentos que precedem o seu nascimento. A vida da Malala que emocionou o mundo começa muito antes, com o surgimento de seu país, com a luta de seu pai numa tentativa de abrir as portas educacionais às crianças paquistanesas. Logo, Eu sou Malala é um livro que intrinsecamente narra estas três histórias: a da formação do Paquistão, a da formação da família Yousafzai e a da própria Malala e seu atentado.

Logo no prólogo, temos uma breve descrição de como foi o momento em que Malala foi baleada e desde já, somos levados a várias reflexões. Dentre elas, nos perguntamos: de que vale a violência gratuita?

A obra é dividida em 5 partes. Na primeira, há uma descrição de como a família Yousafzai se constituiu e de como era a vida antes da chegada do Talibã ao vale do Swat. Esta parte é fundamental, pois ela apresenta ao leitor as crenças, os costumes, o modo de vida da comunidade do vale, além de ser uma justificativa das convicções de Malala. A menina cresceu vendo a luta de seu pai para ter e manter suas escolas abertas, além disso, sempre gostou de ouvir as conversas dos mais velhos sobre política.

A segunda parte retrata a chegada do Talibã ao vale, a destruição do patrimônio histórico-cultural da região, a resistência de Malala e seu pai à pressão sofrida para o fechamento da escola de meninas. A violência presente no dia a dia das pessoas passa a ser cada vez mais presente e intensa. Até que culmina no que vem descrito na parte três: o atentado sofrido pela Malala – não mais por ela frequentar a escola, mas sim por ela o fazer e discursar contra as ideias radicais e extremistas dos talibãs.

Até este ponto da leitura, o livro me deixou muito dividida: se por um lado eu admiro a força e a determinação de Malala e sua família, na luta pelos direitos básicos das pessoas do Swat (seja na questão educacional, seja dividindo a própria comida com quem não tinha um grão de arroz para se alimentar); por outro, a crueldade a troco de nada, a violência, a privação e a busca desenfreada por poder só me deixou abalada. Ver os rumos da nossa humanidade assusta em certos aspectos e Eu sou Malala nos mostra uma realidade tão cruel que é impossível não se sensibilizar e não temer tudo isso.


No meio do livro há fotos dos momentos mais marcantes da vida da Malala.
A quarta parte é que relata os momentos de desespero em que os pais da Malala não sabiam ao certo a gravidade de seu acidente. Nela vemos também como a falta de infraestrutura pode ser fator determinante para o fracasso de um tratamento médico – o que me fez traçar um paralelo e pensar na realidade brasileira e no quanto as pessoas pobres sofrem com isso. É nesta parte também que vemos com detalhes como a Malala viaja até a Inglaterra, para – na quinta e última parte – entendermos como ela e sua família se estabelecem em Birmingham.

A obra termina com um prólogo em que Malala faz um relato de como é a sua vida atualmente. Percebe-se então a importância da liberdade em nossas vidas. Uma coisa é mudarmos de país por opção própria; outra é ser forçado a fazê-lo da noite para o dia, sem ter uma perspectiva de retorno. Ainda que Malala viva em pleno conforto – e possa estudar em liberdade – seu maior desejo é ver as árvores do Swat novamente, fato que não há perspectiva de acontecer tão cedo.

Eu sou Malala é um livro simples e ao mesmo tempo profundo. Sua leitura é fácil; seus fatos complexos; suas palavras tocantes e transformadoras, capazes de mudar uma vida inteira. Não há como terminar esta leitura sendo a mesma pessoa que a iniciou. Malala é exemplo, é perseverança, é vida - mesmo com o mundo dizendo para que ela fosse contra a todos os seus princípios. 

“‘Que possamos pegar nossos livros e canetas’, eu disse. ‘São as nossas armas mais poderosas. Uma criança, um professor, um livro e uma caneta podem mudar o mundo’”. (Eu sou Malala, Malala Yousafzai – página 324).

Capa.
Livro: Eu sou Malala
Subtítulo: A história da garota que defendeu o direito à educação e foi baleada pelo Talibã
Autor: Malala Yousafzai - com Chirstina Lamb
Tradução: Caroline Chang, Denise Bottman, George Schlesinger, Luciano Vieira Machado
Editora: Companhia das Letras
Páginas: 360
Sinopse: Quando o Talibã tomou controle do vale do Swat, uma menina levantou a voz. Malala Yousafzai recusou-se a permanecer em silêncio e lutou pelo seu direito à educação. Mas em 9 de outubro de 2012, uma terça-feira, ela quase pagou o preço com a vida. Malala foi atingida na cabeça por um tiro à queima-roupa dentro do ônibus no qual voltava da escola. Poucos acreditaram que ela sobreviveria. Mas a recuperação milagrosa de Malala a levou em uma viagem extraordinária de um vale remoto no norte do Paquistão para as salas das Nações Unidas em Nova York. Aos dezesseis anos, ela se tornou um símbolo global de protesto pacífico e a candidata mais jovem da história a receber o Prêmio Nobel da Paz. Eu sou Malala é a história de uma família exilada pelo terrorismo global, da luta pelo direito à educação feminina e dos obstáculos à valorização da mulher em uma sociedade que valoriza filhos homens. O livro acompanha a infância da garota no Paquistão, os primeiros anos de vida escolar, as asperezas da vida numa região marcada pela desigualdade social, as belezas do deserto e as trevas da vida sob o Talibã. Escrito em parceria com a jornalista britânica Christina Lamb, este livro é uma janela para a singularidade poderosa de uma menina cheia de brio e talento, mas também para um universo religioso e cultural cheio de interdições e particularidades, muitas vezes incompreendido pelo Ocidente. “Sentar numa cadeira, ler meus livros rodeada pelos meus amigos é um direito meu”, ela diz numa das últimas passagens do livro. A história de Malala renova a crença na capacidade de uma pessoa de inspirar e modificar o mundo.

Clique aqui para ler o trecho disponibilizado pela editora.
Veja aqui o livro no skoob.

PS: No livro a Malala cita um documentário que o jornal The New York Times fez sobre ela e a violência no Vale do Swat, chamado Class Dismissed in Swat Valley. Como o vídeo está disponível no youtube, segue abaixo. Ele é em inglês, mas mesmo quem não sabe o idioma consegue ter a dimensão da crueldade por todos vivida. Só em ver as imagens também dá para perceber o quanto a Malala foi corajosa em discursar tantas vezes contra o Talibã.


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